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Procedimentos de fiscalização prévia no comércio exterior: mais avanços que retrocessos

Por André Folloni | @comexblog

Em artigo anterior, que escrevi a respeito da Instrução Normativa (IN) da Receita Federal do Brasil n.º 1.169/2011, tratando do procedimento especial de fiscalização aduaneira destinado a identificar o cometimento de infrações puníveis com pena de perdimento, reclamei da existência de ilegalidades evidentes naquela normativa.

Não me conformo com o fato da Receita Federal querer empurrar, goela do direito abaixo, questões de valoração aduaneira ou de falsidade ideológica para a penalização com o perdimento das mercadorias. Se a lei não o admite, a Receita Federal não pode forçar que assim seja, sem legitimidade democrática.

E não parece tão difícil requerer, à Presidência da República, que atue perante o Poder Legislativo para fazer as coisas do jeito certo, com respeito à Constituição. O exemplo deve vir de lá. Por isso, lamentei que a Receita Federal não demonstrasse preocupação com o excesso de causas que são aduzidas perante o Poder Judiciário para coibir as ilegalidades que pratica.

Mas é preciso fazer justiça. Menos de um mês depois, a Receita Federal publicou, em 17 de agosto, sua Instrução Normativa n. 1.181, estabelecendo o que chamou de “procedimento de verificação de conformidade aduaneira aplicado a operador estrangeiro”.

O exame desse documento revela uma intenção positiva: submeter a operação de importação a uma avaliação prévia de legalidade. Caso seja reconhecida a correção da operação que se pretende realizar, a Receita Federal daria uma espécie de chancela, evitando que a importação fosse direcionada para os procedimentos especiais de fiscalização aduaneira – que, atual e absurdamente, preveem a retenção das mercadorias importadas por prazo indefinido, que pode se estender tanto que jamais acabaria, independentemente da vontade da Receita Federal e do importador.

Tudo indica que esse novo procedimento está relacionado ao Programa do Operador Econômico Qualificado e do Programa Aduaneiro de Segurança, Controle e Simplificação – PASS, que a Receita Federal deve implantar nos próximos meses.

Na linha recomendada pela Organização Mundial das Aduanas, a Receita Federal do Brasil passaria a ter um cadastro de operadores confiáveis, a quem reservaria um tratamento privilegiado.

Semelhante ao que ocorre na Linha Azul, essas empresas passariam por um procedimento prévio específico e rigoroso, que atestaria sua idoneidade e confiabilidade. A partir desse “atestado de conformidade”, a empresa aprovada estaria apta a operar com vantagens importantes, podendo operar com procedimentos de fiscalização simplificados.

Esse procedimento prévio é facultativo: o importador decide se exporá seu exportador para a Receita Federal, afim de obter a certificação. Não havendo o pedido, ou sendo, ele, indeferido, isso não significa que o importador não poderá negociar com aquele exportador não previamente fiscalizado ou não aprovado.

Porém, estará sujeito aos procedimentos especiais de fiscalização aduaneira. É razoável prever que, na prática, a ausência de verificação de conformidade aduaneira será um item determinante na escolha pela aplicação dos procedimentos especiais.

O “operador estrangeiro” a que se refere a IN 1.181 é definido, por seu artigo 2.º, II, como “o produtor, o fabricante ou o exportador estabelecido em outros países, integrante da cadeia de fornecimento de mercadorias importadas”.

Mas ele é incapaz, juridicamente, de iniciar o procedimento de verificação: é seu importador, no Brasil, que detém a legitimidade para solicitar a adesão ao procedimento (art. 4.º, caput, da IN 1.181). O artigo 3.º da IN exemplifica o que pode ser levado em consideração, pelo agente competente, quando da análise da conformidade:

  • A existência de fato e de direito do operador estrangeiro, com a identificação de seus controladores e administradores;
  • A capacidade produtiva declarada, seja ela do próprio operador estrangeiro, seja a de seus fornecedores, que devem ser expostos;
  • O processo produtivo de que se vale o exportador, para fins de atendimento às regras de origem das mercadorias importadas;
  • Identificação das matérias-primas e de outros aspectos, de forma a permitir a correta classificação fiscal das mercadorias importadas;
  • A especificação das marcas comerciais e dos direitos de reprodução, utilizados nessas mercadorias; e a aferição de custos de produção, despesas e margens de agregação de valor.

Neste último caso, porém, fica clara, novamente, a intenção, da Receita Federal, de submeter aos procedimentos especiais de fiscalização aduaneira as importações sobre as quais recaiam suspeita de subfaturamento.

Isso é ilícito, porque esses procedimentos só cabem quando há a suspeita fundamentada de infração punível com pena de perdimento, e a subvaloração aduaneira não é, no direito aduaneiro brasileiro contemporâneo, ilicitude punível com essa penalidade, e sim com multa sobre o tributo não recolhido.

Essa insistência no erro é inaceitável e representa um desrespeito, por parte da Receita Federal, ao Poder Judiciário, que assentou a impunibilidade, da subvaloração aduaneira, com a pena de perdimento.

E é uma insistência, com efeito, incisiva: a nova Norma de Execução Coana  n.º 2, de 17 de agosto de 2011, que trata dos procedimentos de fiscalização no curso do despacho aduaneiro de importação de produtos têxteis e de vestuário, ao passo que toma a ausência de cadastro do exportador no Programa de Conformidade da IN 1.181 como uma causa suficiente para o encaminhamento das mercadorias importadas para o procedimento especial de fiscalização aduaneira previsto na IN 1.169, também toma a diferença de valor aduaneiro como uma causa suficiente para a instauração desse procedimento. Em ambos os casos, parece haver ilicitude.

No último, sem dúvida: subvaloração aduaneira não é punível com pena de perdimento; no primeiro, a sensação é a mesma, porque a falta de certificação de conformidade não é, por si só, indício a provocar uma suspeita fundamentada de infração punível com pena de perdimento.

Além da documentação da empresa e de seus sócios, a Receita Federal exige, ainda, a apresentação de fotografias e filmagens dos produtos e da linha de produção, além de apontamento da localização geográfica de onde é feita a produção.

Para a concessão da chancela de conformidade, a Receita Federal poderá, inclusive, visitar as instalações do operador estrangeiro, conhecendo seu processo produtivo e sua condição de empresa existente de fato – impedindo sua caracterização posterior como empresa de fachada.

Nesse caso, porém, ficará a encargo do exportador o apoio para obtenção de vistos de entrada, no país estrangeiro, aos servidores aduaneiros, intérprete e transporte entre o ponto de hospedagem dos servidores e os locais a serem visitados, como os estabelecimentos do exportador e os órgãos públicos do país estrangeiro, além dos custos pela viagem.

Julgado procedente o pedido de declaração de conformidade, a Receita Federal expedirá Ato Declaratório Executivo – ADE, com validade nacional, especificando o país de origem das mercadorias; as localizações das áreas de produção, dos estabelecimentos produtivos e de armazenagem, documentados no processo, inclusive os eventualmente verificados in loco, as mercadorias que foram objeto da análise, por sua classificação na Nomenclatura Comum do Mercosul – NCM e suas respectivas descrições; e, se aplicável, as marcas comerciais utilizadas e os titulares de direitos de reprodução.

Lamentavelmente, o prazo de verificação é muito longo. O artigo 5.º, § 5.º, da IN 1.181, estabelece prazo de noventa dias, prorrogável em caso de visita técnica, para a finalização do procedimento. E qual a sanção para o descumprimento desse prazo?  Curiosamente, a sanção é que o prazo seja estendido para 210 dias e que, nesse interim, a Superintendência Regional da Receita Federal tome a decisão.

O balanço é positivo. É esperar para ver como funcionará, na prática, esse novo procedimento.

Andre Folloni

Advogado, Doutor em Direito do Estado pela UFPR, Professor da PUCPR - apf@marinsbertoldi.com.br

Analista de Importação Profissional

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